O medo de ser nocauteado tira a vontade de vencer pela via rápida
Jorge Luiz Tourinho
4 de setembro de 2022
Como pode um boxeador vencer um combate? Basta derrubar ou castigar o oponente a ponto do árbitro encerrar a luta. Se não for pela chamada via rápida, basta que o lutador vença a maioria dos assaltos ou, se houver rounds pontuados diferentes de 10-9, fazer a pontuação maior na visão de, pelo menos, dois juízes.
Foi com esse pensamento que Oleksandr Usyk (20-0) entrou no ringue do Jeddah Superdome em Jeddah, Arábia Saudita, para enfrentar Anthony Joshua (24-3). Manteve seus cinturões da WBA, IBF, WBO e IBO.
Mesmo tendo conhecimento que a mandíbula do inglês não é confiável, Usyk não tentou em nenhum momento - pelo menos não vi - buscar o triunfo pela via do clorofórmio. Limitou-se, com a maestria que caracteriza seu excelente boxe, a tocar mais vezes que o ex-campeão desses títulos em jogo.
A diferença de altura e envergadura devem ter feito muitos como eu se lembrarem de como Mike Tyson, baixinho comparado com os pesados da sua época, encurtava a distância e bombardeava para tentar liquidar a contenda. O indiscutível campeão mundial ucraniano tem excelente linha e muita experiência - treina desde os 12 anos -, mas lhe falta a volúpia que caracterizou os grandes pesos pesados de menor peso e tamanho.
Não sei se o que lhe falta é pegada. Alguns adversários foram por ele dobrados antes do tempo pactuado. O que me parece é que preferiu a repetição da estratégia que deu certo quando se sagrou campeão na peleja anterior contra o mesmo Joshua.
Por outro lado, não deu para entender a troca de treinador feita pela equipe britânica. Foram buscar na Califórnia o hiper-super-mega valorizado Robert Garcia para que quase nada novo fosse apresentado para voltar do Oriente Médio com as faixas. Pareceu-me, também, que Anthony não queria expor seu queixo e se arriscar a sofrer novo nocaute. O fato é que um peso pesado gigantesco e com dinamite nos punhos como é o caso dele deveria encurralar tomando o centro do quadrilátero. Se Usyk chegasse perto, porque não trocar golpes? Foi assim que Joshua se tornou ídolo e campeão mundial. A derrota para Andy Ruiz em junho de 2019 - TKO7 - fez com que adotasse o modo cauteloso de boxear.
O único capítulo em que imaginei que Joshua pudesse abreviar a contenda foi o nono. Um balaço de esquerda nas costelas fez o europeu envergar acusando o golpe. Nos demais, buscaram atacar e golpear, mas fugiram das trocas francas que empolgam e fazem lutas serem lembradas para sempre. Enfim, o conhecimento do regulamento e das normas de pontuação fizeram bem ao agora milionário campeão. Talvez um Rei sem carisma.
Para minha surpresa, a decisão foi dividida. Glenn Feldman 113-115, Viktor Fesechko 116-112 (foi o que marquei) e Steve Gray 115-113.
Frank Warren deve estar convencendo o Rei Cigano a fazer mais uma luta para entrar na história com mais destaque. Não tenho dúvida que Tyson Fury entra como franco favorito contra Usyk, se houver o combate que pode lhes render 50 milhões de libras. Quando triunfou sobre Dillian Whyte, Fury abiscoitou 30 milhões!
Preliminares exibidas na DAZN.
Super galos - Ramla Ali (7-0) KO1 Crystal Garcia Nova (10-3).
Piada de péssimo gosto! Foi a primeira luta feminina na Arábia Saudita. A perdedora está sonada. Caiu no primeiro piparote que recebeu. Ali é a boxeadora do Eddie Hearn, mas nada pode ser visto.
Super leves - Ziyad Almeayouf (1-0) TKO1 Alfredo Alatorre (0-1)
Outra piada. Pelo menos, o mexicano veio para trocar golpes e levou a pior. Duas quedas levaram Daniel Van De Wiele a decretar o nocaute técnico.
Cruzadores - Badou Jack (27-3-3) W10 Richard Rivera (21-1).
Combate duríssimo e equilibrado. Rivera deixou sua invencibilidade e saiu reclamando barbaridade. A verdade é que se esperava muito mais de Jack um ex-campeão em divisões mais leves que essa. As papeletas foram: 96-94 (2) e 94-96. O comentarista Chris Mannix e eu marcamos 95-95.
Super leves - Bader Al Samreen (6-0) TKO4 Fued Tarveshi (5-3)
Absoluto no ringue, Bader foi construindo categórica vitória. A queda no quarto tempo fez a decisão ser aplicada.
Pesados - Filip Hrgovic (15-0) W12 Zhilei Zhang (24-1-1)
Apresentada como eliminatória pelo título da IBF, foi uma decepção. Ambos não tiveram combustível para chegar ao final com certa dignidade. O croata caiu no primeiro assalto, mas o chinês não teve pressa para acabar com a festa. Resultado: acabou derrotado em decisão controversa. A partir do nono episódio, protagonizaram um espetáculo lamentável do tipo "não me bate que não te bato para chegarmos ao final".
O resultado que não poderia acontecer seria derrota dos dois. Portanto, os escores foram lidos. 115-112 (2) e 114-113. Marquei 113-114.